Saiba o que estudos dizem sobre sonhos nos quais estamos perfeitamente conscientes de que estamos sonhando.
ocê está correndo em direção a um penhasco. O vento bate no seu rosto e você pode sentir o frescor do ar contra sua pele. Quando você chega na ponta, não consegue parar – parecia que dava, mas aí não deu, e você despenca. Mas voa – você voa! Ao seu lado, o Papa. E não há nada de estranho nisso, é muito natural voar ao lado do Papa Francisco. De repente, puff, você se dá conta que aquilo é um sonho. E, como num tranco, o sonho termina.
Imagine se fosse possível não despertar de um sonho lúcido, no qual você sabe que está sonhando? As possibilidades seriam infinitas: daria pra visitar lugares que você nunca foi, conversar com gente inacessível de outra forma, voar, se transformar em um bicho… aliás, pode começar a fazer sua lista do que você faria se pudesse despertar sua consciência dentro de um sonho, porque isso é perfeitamente possível.
Sonhos lúcidos não são incomuns e eu aposto que você já teve um pelo menos uma vez. A controvérsia está na nossa capacidade – ou não – de permanecer consciente durante nossos sonhos. Pouco se sabe sobre o que acontece com o cérebro durante sonhos lúcidos e, mais importante, quando alguém consegue controlá-los. Muitos cientistas ainda dizem que isso é impossível, enquanto outros alegam que há muita coisa que não sabemos sobre o cérebro pra chegarmos a uma conclusão sobre isso.
A ciência tem alguns registros documentados desse tipo de fenômeno. Nesse estudo, de 2000, o psicofisiologista Steve LaBerge, um dos maiores especialistas sobre o assunto no mundo, pediu a indivíduos que mexessem os olhos em um padrão pré determinado durante sonhos lúcidos e foi capaz de observar e registrar esse momentos durante o experimento – ou seja, as pessoas ficaram conscientes durante o sonho e repetiram a instrução do pesquisador. Além disso, ele descobriu que esse tipo de experiência lúcida sempre acontece no quinto estágio do sono, o REM, no qual o corpo está totalmente paralisado com exceção das pálpebras.
O pesquisador Sergio Arthuro, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, publicou no ano passado um estudo inédito no Brasil sobre as diferenças no padrão cerebral para sonhos lúcidos e sonhos comuns. Usando algumas das experiência de LaBerge como norte, ele e outros pesquisadores concluíram que estudar sonhos lúcidos pode ser a chave para chegar à cura de doenças como a esquizofrenia ou pesadelos recorrentes em casos de depressão grave ou estresse pós-traumático. “Existe também uma linha de pesquisa chamada imaginação motora, que sugere que se você imaginar movimentos que você quer fazer, pode melhorar seu desempenho desses movimentos na vida real. Ou seja, o estudo de sonhos lúcidos pode também beneficiar deficientes físicos ou atletas que queiram melhorar o desempenho”, revela ele.
O site Lucidity.com reúne uma bibliografia científica interessante, em inglês, sobre o tema, com foco nos estudos de LaBerge.
As mais de 3 mil pessoas do grupo Sonhos Lúcidos, no Facebook, não têm nenhuma dúvida de que ter sonhos lúcidos controlados seja perfeitamente viável pra qualquer tipo de pessoa. A maioria dos participantes do grupo já teve experiências do tipo e muitos têm sonhos controlados com frequência. O técnico de informática e programador Jean Pierre Ribeiro, de 24 anos, conta que se interessou pelo assunto depois de ter alguns episódios envolvendo paralisia do sono e alucinações assustadoras. Ele diz que resolveu o problema recorrente ao dominar a técnica dos sonhos lúcidos e conseguir guiar os próprios pesadelos. “Em uma das paralisias, comecei a imaginar o céu, e aquilo me transportou para o céu, e fiquei flutuando no céu, e via perfeitamente as nuvens, e um chuvisco bem fino caia no meu rosto. Fiquei assim por um bom tempo até a paralisia passar, e as imagens do sonho começarem a se misturar com o ambiente do quarto. Depois disso ficou fácil, os sonhos sempre me davam pistas [de que eram um sonho]”, contou.
Se você pensou no filme Inception, vai lembrar que, nele, Leonardo DiCaprio tinha “âncoras” que lhe permitiam saber se estava sonhando ou não. Essa é uma das técnicas usadas pelos sonhadores lúcidos – eles criam uma âncora com a realidade que pode ser verificada no sonho. A ideia é reconhecer, durante o dia, elementos exclusivos da realidade não-onírica. Por exemplo: em um sonho, se você apertar o interruptor da luz, não necessariamente a luz acende ou apaga. Na vida real, a não ser que a lâmpada esteja queimada, pressionar o interruptor vai sempre ter um efeito. E se você se acostumar, no cotidiano, a checar se a luz acende ou apagar todas as vezes que você toca o interruptor, dizem os especialistas, você vai começar a repetir os mesmos hábitos nos sonhos. Daí, diante de um resultado improvável – digamos, tudo fica colorido quando você aperta o interruptor – você saberá que está sonhando. Vale pra qualquer coisa, como se olhar no espelho e checar a imagem que aparece antes de ir pro trabalho, por exemplo. O importante é que seja um hábito e que lhe permita checar a realidade.
Outra técnica é fazer um diário de sonhos: separe um caderno e todos os dias, ao acordar, anote tudo o que se lembrar sobre seus sonhos. Mas faça isso ao acordar, pois as memórias do que a gente sonha tendem a enfraquecer ao longo do dia.
Vários especialistas recomendam técnicas diferentes. Algumas, sugerem induzir o cérebro – literalmente soprar pra si mesmo “vou ter um sonho lúcido essa noite”, outras recomendam despertar por um número específico de vezes durante a noite para aumentar as chances de controlar os sonhos. Mas nenhuma fórmula é definitiva e, de acordo com os relatos, cada coisa funciona de maneira diferente com cada pessoa.